segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Enquanto é feira



O diálogo não parecia possível. O ouvido ainda não era de mercador. Ela trocava bananas por maças na feira. E ainda sim, achava de bom tom, esclarecer as mágoas. Então, tirou um lápis da bolsa e num guardanapo esboçou o que deveria ser uma carta de trégua.

Quero colocar um aviso de ocupado na minha porta. 
Talvez um que diga algo como: Fechado para balanço ou Aqui, em breve, uma nova pessoa. Mas o balanço já foi feito e eu já sou uma nova pessoa. O mais apropriado, então, seria dizer algo como: peça para entrar. Eu já sei as coisas que não quero. E dentre elas, ser invadida por você ou por outro alguém. Eu sei que na ânsia de me ver bem, você acaba nos atropelando. Não é maldade, só um jeito perverso de lidar com a vida.  Um jeito doloroso que nos separou há tanto tempo atrás que nem importa quando. Eu mudei muito. E sei que mudanças te assustam. Você não precisa me salvar. Eu já me salvei. Tire o medo do olhar, a angústia da palavra, o receio do gesto, a roupa do corpo. Ou não tire nada. Se quiser algo para acreditar, acredite quando digo que estou bem. Bem de um jeito que nunca estive antes! 


Agradeço tudo e muito mais.

            Repousou o lápis na mesa bamba, encarou as fileiras formadas por palavras no papel. Era isso que queria dizer? Já não sabia. Dobrou o guardanapo e cuidadosamente o guardou dentro da bolsa dos ovos. Lembrou-se de que a espera costuma ser sábia mesmo quando a vida insiste em ser ligeira. Aproveitou a sombra das árvores do lado de lá da rua e correu para casa. O almoço ainda não havia sido feito.

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